Uma menina

Monique Bonomini
2 min readOct 5, 2024

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Uma pessoa segura uma máscara de carnaval branca e dourada após a tirar
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Tentaram esconder a menina.

Uma menina que via e enxergava o que os outros pareciam não ver ou enxergar e que tentava entender o que fazer com o que a perturbava. Ela encarava todos à sua volta, investigando como eles eram e percebendo, com isso, como ela não era.

Era uma menina estranha, diziam, vivia perdida em seus próprios pensamentos, reparando em tudo como se procurasse alguma coisa perdida.

Essa menina, que observava, olhava, via e não se enxergava entre aqueles que a queriam mais simpática, mas menos falante, mais arrumada, mas menos chamativa, mais inteligente, mas menos esperta, mais atenta, mas menos direta, mais delicada, mas menos sincera, vestiu uma máscara; recortou, colou e pintou um disfarce com tudo o que gostariam que ela fosse.

Mas, por debaixo da bela imagem, a menina começava a acumular palavras, frases e histórias, feitas de tudo o que ela acumulou com suas observações do mundo.

Até que a máscara deixou de servir, porque a menina crescia e, com ela, as palavras, e suas frases também aumentavam e já eram tantas as histórias, as dessa menina que via a todos, mas não se via em ninguém, que nenhuma máscara podia se conformar numa cara que começava a ficar impossível de esconder.

A menina tornou-se uma mulher e a máscara caiu, então ela rasgou de vez o discurso em paráfrase e despiu-se do que lhe diziam de si para ser a palavra de si mesma, pois uma mulher que não assume o próprio rosto e não prega a própria palavra arrisca-se a viver confusa, sem saber se é ou se apenas tenta ser.

Uma mulher não se esconde. Uma mulher não é uma menina.

Este texto compõe o livro Eva no tempo, de Cidinha Rodrigues, publicado pela Boutique do Livro. Se você gostou deixe palminhas e o faça chegar mais longe. Você pode deixar até 50 palminhas.

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Monique Bonomini

Sou revisora, faço leitura crítica e também escrevo. Ler é um prazer.